domingo, 1 de junho de 2008

A insustentável incerteza do ser

No meio de muitas de muitas pessoas, naquela festa de sábado à noite, ela não encontrara ninguém. Sentia-se só, mesmo rodeada da jovialidade e da dita alegria que enchiam o ambiente.

Não sabia se voltava pra casa, ou se escolhia um canto qualquer. Na dúvida, escolheu uma varanda vazia, de onde só se escutava o resto de melodias perdidas de uma solitude acompanhada. Sentada no canto, tinha em uma das mãos seu copo, na outra um cigarro. No coração a angústia de ser mais uma, de ser esquecida, de ter a certeza de não estar mais certa de nada.Não estava certa de nada, nem sabia se um dia o estivera.

Só tinha certeza de que amava e que tudo o que queria era gritar isso para o mundo. Porém o mundo havia se acostumado a seu jeito firme de mulher contida, independente, que não fazia do amor muleta para sua existência. Não, não podia deixar que pensassem em sua fragilidade, que escutava canções de amor, e que elas a faziam lembrar-se de certos momentos, de um certo alguém que um dia esteve a seu lado e cuja companhia hoje em dia parece difícil de reaver.

Um trago, um gole. Dopar-se não lhe parece agora tão fora da realidade. Porque aquela era sua realidade, realidade só e acompanhada, desejos disfóricos de desaparecer e reaparecer, como se escrevesse a cada momento um pedaço apagando outro, sobrescrevendo-os, como se fosse uma maneira de sentir menos dor, pelo menos naquele instante. Como sempre, nunca quis saber dos efeitos colaterais. Eram-lhe uma espécie de conforto nos momentos em que não queria pensar não pensar em nada.

E assim transcorre a noite, e ela, ali, enquanto lá fora, bocas, juras, corpos; ela, aqui, pensando , e se perguntando se tudo isso valia mesmo a pena, se tudo isso não seria meio - verdade, se vale a pena meio- viver.

Um comentário:

palco da poesia disse...

A insustentável incerteza do ser

Há sempre uma varanda vazia quando se encontra com a solidão, mas à noite, são sempre muito frias.
Para muitos, só os fatos extraordinários, e sobretudo, no mundo de hoje, os violentos, são fontes de inspiração. Todavia, quando se tem alma de poeta, uma simples varanda vazia, e uma mulher contida, se dá o grande encontro entre a vida e a poesia.
E para aquelas que se encontram esquecidas, há sempre um coração quente e vazio querendo acolher uma alma fria, nas noites da vida.